sexta-feira, 8 de setembro de 2017




A Casa do Escritor


O escritor organiza-se no seu texto como em sua casa. Comporta-se nos seus pensamentos como faz com os seus papéis, livros, lápis, tapetes, que leva de um quarto para o outro, produzindo uma certa desrodem.  Para ele, tornam-se peças de mobiliário em que se acomoda, com gosto ou desprazer.

Acaricia-os com delicadeza, serve-se deles, revira-os, muda-os de sítio, desfá-los. Quem já não tem nenhuma pátria, encontra no escrever a sua habitação. E aí produz, como outrora a família, desperdícios e lixo.

Mas já não dispõe de desvão e é-lhe muitíssimo difícil livrar-se da escória. Por isso, ao tirá-la da sua frente, corre o risco de acabar por encher com ela as suas páginas.

A exigência de resistir à auto-compaixão inclui a exigência técnica de defrontar com extrema atenção o relaxamento da tensão intelectual e de eliminar tudo quanto tenda a fixar-se como uma crosta no trabalho, tudo o que decorre no vazio, o que talvez suscitasse, num estádio anterior, como palavreado, a calorosa atmosfera em que emerge, mas agora permanece bafiento e insípido. Por fim, já nem sequer é permitido ao escritor habitar nos seus escritos.


Theodore Adorn
filósofo, sociólogo e músico
que nasceu em 11 de setembro de  1903, na Alemanha

Nenhum comentário:

Postar um comentário