O Nascimento do Prazer
O prazer nascendo
dói tanto no peito que se prefere sentir a habituada dor ao insólito prazer. A
alegria verdadeira não tem explicação possível, não tem a possibilidade de ser
compreendida – e se parece com o início de uma perdição irrecuperável. Esse
fundir-se total é insuportavelmente bom – como se a morte fosse o nosso bem
maior e final, só que não é a morte, é a vida incomensurável que chega a se parecer
com a grandeza da morte.
Deve-se deixar
inundar pela alegria aos poucos – pois é a vida nascendo. E quem não tiver
força, que antes cubra cada nervo com uma película protetora, com uma película
de morte para poder tolerar a vida. Essa película pode consistir em qualquer
ato formal protetor, em qualquer silêncio ou em várias palavras sem sentido.
Pois o prazer não é de se brincar com ele. Ele é nós.
Clarice Lispector, nascida na Ucrânia em 1920,
naturalizada nordestina.
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