As Paixões Humanas
Eu considero
inteligente o homem que em vez de desprezar este ou aquele semelhante é capaz
de o examinar com olhar penetrante, de lhe sondar por assim dizer a alma e
descobrir o que se encontra em todos os seus desvãos. Tudo no homem se
transforma com grande rapidez; num abrir e fechar de olhos, um terrível verme
pode corroer-lhe as entranhas e devorar-lhe toda a sua substância vital.
Muitas vezes uma
paixão, grande ou mesquinha pouco importa, nasce e cresce num indivíduo para
melhor sorte, obrigando-o a esquecer os mais sagrados deveres, a procurar em
ínfimas bagatelas a grandeza e a santidade. As paixões humanas não têm conta,
são tantas, tantas, como as areias do mar, e todas, as mais vis como as mais
nobres, começam por ser escravas do homem para depois o tiranizarem.
Bem-aventurado
aquele que, entre todas as paixões, escolhe a mais nobre: a sua felicidade
aumenta de hora a hora, de minuto a minuto, e cada vez penetra mais no
ilimitado paraíso da sua alma. Mas existem paixões cuja escolha não depende do homem:
nascem com ele e não há força bastante para as repelir.
Uma vontade
superior as dirige, têm em si um poder de sedução que dura toda a vida.
Desempenham neste mundo um importante papel: quer tragam consigo as trevas,
quer as envolva uma auréola luminosa, são destinadas, umas e outras, a
contribuir misteriosamente para o bem do homem.
Nicolau Gogol
Escritor, nascido na Rússia em 1809