Renunciar à Sede de Poder
Quem não conheceu a tentação de ser o primeiro na cidade nada
compreenderá do jogo político, da vontade de submeter os outros para deles
fazer objetos, nem adivinhará os elementos de que é composta a arte do
desprezo.
A sede de poder, raros são os que não a tenham num grau ou
noutro experimentado: é-nos natural, e contudo, se a considerarmos melhor,
assume todos os carácteres de um estado mórbido do qual apenas nos curamos por
acidente ou então por meio de um amadurecimento interior, aparentado com o que
se operou em Carlos V quando, ao abdicar em Bruxelas, no topo da sua glória,
ensinou ao mundo que o excesso de cansaço podia suscitar cenas tão admiráveis
como o excesso de coragem.
Mas, anomalia ou maravilha, a renúncia, desafio às nossas
contantes, à nossa identidade, sobrevém somente em momentos excepcionais, caso
limite que satisfaz o filósofo e perturba profundamente o historiador.
Emil Cioran
Filósofo e escritor, nascido na Romênia,
dia 8 de abril de 1911
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