Arrumar os Mortos
É preciso que compreendam: nós não temos
competência para arrumarmos os mortos no lugar do eterno.
Os nossos defuntos desconhecem a sua
condição definitiva: desobedientes, invadem-nos o quotidiano, imiscuem-se do
território onde a vida deveria ditar sua exclusiva lei.
A mais séria consequência desta
promiscuidade é que a própria morte, assim desrespeitada pelos seus inquilinos,
perde o fascínio da ausência total.
A morte deixa de ser a mais incurável e
absoluta diferença entre os seres.
Mia Couto
Mia Couto
escritor e biólogo,
nascido em Moçambique, em 1955
a arte africana
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