sexta-feira, 1 de dezembro de 2017




Milágrimas

Em caso de dor, ponha gelo, mude o corte de cabelo, mude como o modelo vá ao cinema, dê um sorriso, ainda que amarelo, esqueça seu cotovelo se amargo for já ter sido, troque já esse vestido, troque o padrão do tecido aia do sério, deixe os critérios, siga todos os sentidos e faça fazer sentido.

A cada mil lágrimas sai um milagre caso de tristeza, vire a mesa, coma só a sobremesa, coma somente a cereja, jogue para cima, faça cena, cante as rimas de um poema.  Sofra apenas, viva apenas sendo só fissura, ou loucura, quem sabe casando cura e  ninguém sabe o que procura;

Faça uma novena, reze um terço, caia fora do contexto  invente seu endereço e a cada milágrimas sai um milagre, mas se, apesar de banal,
chorar for inevitável sinta o gosto do sal, do sal, do sal, sinta o gosto do sal
gota a gota, uma a uma duas, três, dez, cem, mil lágrimas.  Sinta o milagre
a cada mil lágrimas sai um milagre a cada milagrimas.

Alice Ruiz
Nascida em Curitiba, 1946
 poetisa e tradutora. Foi casada com Paulo Leminski



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