Ambição e poder
Examinemo-nos no momento em que a ambição nos
trabalha, em que lhe sofremos a febre; dissequemos em seguida os nossos
«acessos».
Verificaremos que estes são precedidos de
sintomas curiosos, de um calor especial, que não deixa nem de nos arrastar nem
de nos alarmar.
Intoxicados
de porvir por abuso de esperança, sentimo-nos de súbito responsáveis pelo
presente e pelo futuro, no núcleo da duração, carregada esta dos nossos frêmitos,
com a qual, agentes de uma anarquia universal, sonhamos explodir.
Atentos aos acontecimentos que se passam no nosso
cérebro e às vicissitudes do nosso sangue, virados para o que nos altera,
espiamos-lhe e acarinhamos-lhe os sinais.
Fonte de perturbações, de transtornos ímpares, a
loucura política, se afoga a inteligência, favorece em contrapartida os
instintos e mergulha-os num caos salutar.
A idéia do bem e sobretudo do mal que imaginamos
ser capazes de cumprir regozijar-nos-á e exaltar-nos-á; e o feito das nossas
enfermidades, o seu prodígio, será tal que elas nos instituirão senhores de
todos e de tudo.
À nossa volta, observaremos uma
alteração análoga naqueles que a mesma paixão corrói. Enquanto sofrerem o seu
império, serão irreconhecíveis, presas de uma embriaguez diferente de todas as
outras. Tudo mudará neles, até o timbre da voz.
A ambição é uma droga que faz um demente em
potência daquele que se lhe entrega. Esses estigmas, esse ar de fera
desvairada, essas linhas inquietas, e como que animadas por um êxtase sórdido,
quem não os tiver observado nem em si próprio nem em outrem permanecerá
estranho aos malefícios e aos benefícios do Poder, inferno tônico, síntese de
veneno e de panacéia.
Emil Cioran,
1911/1995
Filósofo e escritor
nascido na Romênia
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GRUPO DE TEATRO
“SÁBIA INDECISÃO”
O Teatro como Arte
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