A Pluralidade Humana
A pluridade
humana, condição básica da ação e do discurso, tem o duplo aspecto da igualdade
e diferença. Se não fossem iguais, os homens seriam incapazes de compreender-se
entre si e aos seus antepassados, ou de fazer planos para o futuro e prever as
necessidades das gerações vindouras.
Se não fossem
diferentes, se cada ser humano não diferisse de todos os que existiram, existem
ou virão a existir, os homens não precisariam do discurso ou da ação para se
fazerem entender. Com simples sinais e sons poderiam comunicar as suas
necessidades imediatas e idênticas.
Ser diferente não
equivale a ser outro - ou seja, não equivale a possuir essa curiosa qualidade
de “alteridade”, comum a tudo o que existe e que, para a filosofia medieval, é
uma das quatro características básicas e universais que transcendem todas as
qualidades particulares.
A alteridade é,
sem dúvida, um aspecto importante da pluralidade; é a razão pela qual todas as
nossas definições são distinções e o motivo pelo qual não podemos dizer o que
uma coisa é sem a distinguir de outra.
Na sua forma mais
abstrata, a alteridade está apenas presente na mera multiplicação de objetos
inorgânicos, ao passo que toda a vida orgânica já exibe variações e diferenças,
inclusive entre indivíduos da mesma espécie. Só o homem, porém, é capaz de
exprimir essa diferença e distinguir-se; só ele é capaz de se comunicar a si
próprio e não apenas comunicar alguma coisa - como sede, fome, afeto,
hostilidade ou medo. No homem, a alteridade, que ele tem em comum com tudo o
que existe, e a distinção, que ele partilha com tudo o que vive, tornam-se
singularidades e a pluralidade humana é a paradoxal pluralidade dos seres
singulares.
Hannah Arendt
Filósofa política, nascida na Alemanha,
de origem judaica, em 1906
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