16
de novembro
95
Anos de Saramago
Poema
à boca fechada
Não direi:
que o silêncio me sufoca e amordaça. Calado estou, calado ficarei, Pois que a língua que falo é de outra raça. Palavras consumidas se acumulam, se represam, cisterna de águas mortas, ácidas mágoas em limos transformadas, vaza de fundo em que há raízes tortas.
Não direi:
que nem sequer o esforço de as dizer merecem, palavras que não digam quanto sei neste retiro em que me não conhecem. Nem só lodos se arrastam, nem só lamas, nem só animais boiam, mortos, medos, túrgidos frutos em cachos se entrelaçam no negro poço de onde sobem dedos.
Só direi,
crispadamente recolhido e mudo, que quem se cala quando me calei não poderá morrer sem dizer tudo.
Não direi:
que o silêncio me sufoca e amordaça. Calado estou, calado ficarei, Pois que a língua que falo é de outra raça. Palavras consumidas se acumulam, se represam, cisterna de águas mortas, ácidas mágoas em limos transformadas, vaza de fundo em que há raízes tortas.
Não direi:
que nem sequer o esforço de as dizer merecem, palavras que não digam quanto sei neste retiro em que me não conhecem. Nem só lodos se arrastam, nem só lamas, nem só animais boiam, mortos, medos, túrgidos frutos em cachos se entrelaçam no negro poço de onde sobem dedos.
Só direi,
crispadamente recolhido e mudo, que quem se cala quando me calei não poderá morrer sem dizer tudo.
José de Sousa Saramago
Nascido em Azinhaga, Portugal,
em 16 de novembro de 1922
escritor. Foi galardoado com o Nobel
de Literatura de 1998. Também ganhou, em 1995, o Prémio Camões, o mais importante prêmio literário da língua portuguesa.
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