quinta-feira, 30 de abril de 2015


Voo de fuga

Voava
Sobre os passantes
Indiferentes do passeio.

Pairava
De braços de abertos
A colher partículas de vento.

Passava
Leve sobre as cabeças
Voltadas aos olhos do chão
.
Não queria
Nada do mundo dos homens.
Nem pedia
 Nada da mão dos homens.
Desejava quase nada
Da vida dos homens.

Queria ser ave.
 Batia as mãos com insistência
Para espalhar o ar pesado
Que rondava o dia quente.

E pela réstia de luz
Que ardia lá pelas bordas da terra,
Um desenho humano alado,
Escapava pelo fim da tarde
E tinha sonhos ardentes
De apanhar o sol.

José de Lima,
nascido em Guaratinguetá, em 8 de dezembro de 1956, radicado em S. Paulo, é professor de educação artística, ator, artista plástico, compositor de samba de enredo e poeta.

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Casa Cobianchi
parceira do

Sopa de Cebola



·         O não saber da vida
·          
Não sei bem sobre as coisas da vida, muito embora já esteja chegando mais perto do fim dela Não se preocupe, não pretendo ir tão já, apenas uma figura de retórica, afinal estou quase nos setenta. Um bom tempo de vida, mas insuficiente para saber de todas as coisas relativas a ela. “Sei que nada sei”, frase atribuída a Sócrates”, me incomoda  porque acredito que saiba de muitas coisas, como desconheço outras tantas. Só que da vida sei muito pouco. Penso pouco nela, não procuro explicações sobre isso ou aquilo, não me interesso em saber de onde vim nem para onde vou, da mesma forma não me preocupo em identificar a missão a mim confiada. Faço as coisas porque acho que devo fazê-las, se ajudo as pessoas o faço porque alguém me disse, um dia, que era bom ser bom e se agrado outras é porque acho bonito ser gentil Somente isso. Vivo porque é preciso viver e morrerei , um dia, porque a vida vai se cansar de mim.

Jorge Nicoli



Barraca das Dondocas
Parceira do
Sopa de Cebola







Psicanálise e Arte


As criações, obras de arte, são imaginárias satisfações de desejos inconscientes, do mesmo modo que os sonhos, e, tanto como eles, são, no fundo, compromissos, dado que se vêem forçadas a evitar um conflito aberto com as forças de repressão. Todavia, diferem dos conteúdos narcisistas, associais, dos sonhos, na medida em que são destinadas a despertar o inteesse noutras pessoas e são capazes de evocar e satisfazer os mesmos desejos que nelas se encontram inconscientes. À parte isto, fazem uso do prazer perceptivo da beleza formal, aquilo a que chamei um prémio-estímulo. Aquilo que a psicanálise foi capaz de fazer consistiu em captar as relações entre as impressões da vida do artista, as suas experiências causais e as suas obras e, a partir delas, reconstruir a sua constituição e os impulsos que se movem dentro dele. Não se deve julgar que o salaz que procura uma obra de arte se anule pelo conhecimento obtido pela análise. A este respeito é possível que o profano espere acaso demasiado da análise, mas deve advertir-se que ela não esclarece os dois problemas que são, provavelmente, os mais interessantes para ele: não esclarece quanto à natureza dos dotes do artista, nem pode explicar os meios de que o artista se serve para trabalhar a técnica artística. 


Sigmund Freud
nasceu numa cidade do Império Austríaco,, hoje pertence a República Tcheca, em 6 de maio de 1856, foi uma das mais importantes figuras da história da humanidade, por sua inteligência, ousadia e, sobretudo, por sua coragem. Freud não criou a psicologia nem a mente humana, no entanto deu condições  para que ficassem ao alcance do seu entendimento. Faleceu em 1939.

Lucilena Amann
Psicóloga
parceira do
Sopa de Cebola

quarta-feira, 29 de abril de 2015






A Minha Arte é Ser Eu

Se faço estas análises de um modo lasso e casual, não é senão porque assim retrato mais o que sou. De uma análise propriamente profunda não só sou incapaz, mas sou também artista de mais para a pensar em fazer; pensar em faze-la seria pensar em dar de mim a ideia de que sou uma criatura disciplinada e coerente, quando o que sou é um analisador disperso e subtilmente desconcentrado. A minha arte é ser eu. Eu sou muitos. Mas, com o ser muitos, sou muitos em fluidez e imprecisão.
Muitos crêem coisas falsas ou incompletas de mim; e eu, falando com eles, faço tudo por deixa-los continuar nessa crença. Perante um que me julgue um mero crítico, eu só falo crítica. A princípio fazia isto espontaneamente. Depois decidi que isto era porque, no meu perpétuo anseio de não levantar atritos

Fernando Pessoa
nascido em 13 de junho de 1888.  Faleceu em 1935

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Vitória Parra
parceira do
Sopa de Cebola









Um leigo e a ansiedade

Alguém disse que o ser humano é a própria ansiedade, isto é, a ansiedade faz parte do gênero humano. Alguns conseguem lidar com ela de maneira saudável, outros nem tanto.
A ansiedade pode ser benéfica quando bem trabalhada, pois possibilita a ação, contrapõe à inércia, como pode ser prejudicial, quando não percebida, o ansioso se perde em atitudes intempestivas ou, por paradoxal que possa parecer, na impotência. Abdicar-se das coisas porque não pode perder um minuto, não pode esperar a vez. Não vou enveredar pelo terreno da análise profunda da ansiedade, mas sim permanecer no terreno das observações como leigo em psicologia. Estas observações empíricas mostram que o ansioso possui um forte traço egoico, de um egocentrismo exacerbado, isto o torna impaciente.  Esperar significa não ser notado.  Quando corre para obter  respostas, o faz atrás da aprovação. A pressa é essa, ser aprovado e, além de tudo, ser notado. E ser notado é demonstrar sua insatisfação através de gestos e palavras contundentes. Aliás, o autoritarismo é outro traço marcante na personalidade do ansioso e isso ele deixa claro quando contrariado. Deixar um ansioso contrariado não é tarefa difícil, como não é difícil, mesmo para o leigo, perceber o perfeccionismo por trás dos exageros do ansioso. A busca da perfeição é um claro sinal de insegurança que o ansioso esconde com sua impaciência explícita.
·         Como disse, tudo isso é fruto de observações de leigo e qualquer semelhança com pessoas pode ser mera coincidência.

Jorge Nicoli

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Mandala
parceira do

Sopa de Cebola

terça-feira, 28 de abril de 2015




Música

         Vez ou outra, passamos por aqui para lembrar de canções que marcara, de uma forma ou de outra,  a história musical do Brasil.

Loucura, de Lupicínio Rodrigues (1914/1974). Um samba-canção, marca registrada  deste gaúcho, com todos os ingredientes de uma grande dor de cotovelo. Um dramalhão muito bem feito poeticamente. Um Lupicínio em seus melhores  dias mostrando a loucura de um apaixonado. Os versos finais são antológicos: Porque não deixa eu mostrar a essa gente, que ainda existe o verdadeiro amor. Faça ela voltar de novo pro meu lado,eu me sujeito a ser sacrificado. Salve seu mundo com minha dor”.

Grito de alerta, Gonzaguinha (1945/1991), gravado em 79 por Maria Bethânia,  O que é uma bela composição? A união perfeita entre a música, a letra e a melodia, este é o caso deste Grito de alerta. Gonzaguinha fala de uma relação que chega ao fim e como todos os finais: triste. Tudo se resume no verso final: “há  um lado carente dizendo que sim, e esta vida da gente gritando que não”. No you tube se encontra algumas gravações interessantes como de Bruno & Marrone, Eles mesmo. Nathalia Lima e  Renata Pedroh.

Jota Pedro
Colaborador do Sopa de Cebola


J. Nicodemos
Filmagens
parceiro do
Sopa de Cebola




Só pensamentos

Sentar ao Sol já não é tão simples como antes. A vida tornou-se uma correria sem fim. O dia sendo tragado pela noite, à noite deixando rastros durante o dia. E a vida lá fora não espera nada, nem ninguém. Não é fácil perceber que a cada passo para frente, a lacuna entre os sonhos e a realidade aumenta, fica perdida entre um ponto, uma linha estreita que me separa do destino que escolhi. Já me confundo com os personagens dessa história. Sei lá, me pego falando pelas ruas, discutindo existência de seres que nem eles mesmos sabem que são possíveis ou prováveis. Sinto que deixei algo passar por estes vinte anos de intervalo, sai um instante para caminhar, e a densa floresta se fechou as minhas costas sem que eu pudesse retornar. Restou apenas seguir. E depois de anos em sua companhia, agora me liberta. E já não sei o que fazer com a liberdade imposta, suposta, disposta e exposta com tanta vontade. Pensei que seria diferente, desejei coisas em sonhos com início, meio e fim. Hoje não me lembro de metade das tramas, dos cenários, nem dos personagens. Esperei sentada por um príncipe que nunca chegou, sei que se perdeu pela vida. Não era para ser, nunca teve intenção de vir, muito menos de ficar. Mas encontrei alguns sapos pela vida. E beijá-los não foi tão difícil quanto parece, deixa-los partir foi ainda pior. Acostumei-me com as brigas, com os risos soltos pela rua. Mas precisava seguir em frente, erguer os olhos, esquecer o passado. Esquecer das vezes que tentei encontrar o que pudesse preencher o vazio que me acompanha.   Absorver os medos e traumas causados por cada perda. Refazer cada molécula de mim mesma, e saber que nada poderia ter sido, mas de alguma forma será, no momento certo...No meu momento.

Beatriz Cirino



Letras &  Cia.
parceira do
Sopa de Cebola



Uma noite vaga

Pela porta aberta vejo pousada no varal a ave noturna, fazendo companhia para trapos  em verde e amarelo e restos da mortalha de Cristo.. Lá no alto  Jorge tímido sorri para a flor roxa do meu quintal. No quarto, meus vagos olhares vagueiam pelo vazio.
Um grito recorta o silêncio da noite e atravessa a parede do meu quarto.
Um animal se esconde  atrás da imagem de Nossa Senhora e um corpo jovem jaz caído  entre duas cruzes de madeira, enquanto a vela se consome no altar central.
Alheio a tudo, e  protegido por lobos e raposas, o mendigo dorme nas  ruínas do coreto da praça que leva o nome do Padroeiro da conservadora e moralista  cidade,  Jorge se esconde atrás da nuvem negra
Enquanto isso, eu  me acomodo no vazio do quarto, com vagos devaneios  sobre o nada.

Jorge Nicoli




TB Engenharia
parceira do
Sopa de Cebola



segunda-feira, 27 de abril de 2015







Nenhum Ser Feliz Pode Saber Que o é

Com a felicidade acontece o mesmo que com a verdade: não se possui, mas está-se nela. Sim, a felicidade não é mais do que o estar envolvido, reflexo da segurança do seio materno. Por isso, nenhum ser feliz pode saber que o é. Para ver a felicidade, teria de dela sair: seria então como um recém-nascido. Quem diz que é feliz mente, na medida em que jura, e peca assim contra a felicidade. Só lhe é fiel quem diz: fui feliz. A única relação da consciência com a felicidade é o agradecimento: tal constitui a sua incomparável dignidade. 

Theodor Adorno, nascido na Alemanha em , 11 de setembro de 1903, foi filósofo,sociólogo, musicólogo e compositor.  É um dos expoentes da chamada Escola de Frankfurt, juntamente com Max Horkheimer, Walter Benjamin, Herbert Marcuse,Jürgen Habermas e outros.

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Concobre
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Sopa de Cebola




Que preguiça III

Impotência

Se a violência é destrutiva do poder como um dia comentou a filósofa da política Hannah Arendt, podemos dizer que a preguiça também nega o poder, mas não por contradizê-lo e sim por localizar-se onde ele falta. A preguiça é o nome que se dá a uma forma de impotência, à potência que não se realiza. O preguiçoso não é simplesmente aquele que “não pode”, mas aquele que não tenta, não deseja e, no limite, não se permite sair da inatividade na qual está lançado. No fundo, o impotente é aquele que “poderia, mas não pode”. Porém, é preciso lembrar que “não poder” também está ao alcance de todo aquele que pode. Quem faz algo poderia sempre “não ter  feito nada”. O que nos ensina que fazer ou não fazer tem relação direta com a possibilidade de escolha.
A preguiça neste sentido não é o ócio, mas o seu momento negativo, pejorativo. Assim como o negócio é a negação do ócio, mas num sentido positivo, a preguiça é a negação do ócio num sentido pejorativo. Por isso é possível dizer que a preguiça é autoritária, porque ela é fechada, não deixa espaço para as novidades da vida, para outros olhares, para a aceitação de novas potências. Se há segredo em conviver com a preguiça nossa de todo dia, ele está na possibilidade de saber sua diferença com o descanso necessário ou a falta de desejo pela vida e suas possibilidades. É muito bom não fazer nada quando isto é uma escolha, mas não é nada bom ser escravo da própria impotência.

Márcia Tiburi

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Chamomila
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domingo, 26 de abril de 2015




Apenas um escudo         
O dicionário registra arrogância com alguns sinônimos como, altivez, presunção, impertinência, entre outros.  Mas a arrogância vai além de alguns sinônimos.
            E se pode perceber este comportamento com clareza, pois o arrogante costuma não se esconder atrás de palavras tampouco de atitudes. Ele é transparente. Sem rodeios, ainda mais quando tem que  usar a argumentação, aí vem logo a frase “você  não sabe o que está falando” ou “quem é você para discutir comigo? “. Se você não sabe o que está falando ou nem sabe quem é você, então o papo se encerra.
            Se ele é pego em situação um pouco incômoda, logo vem “você não sabe com quem está falando”. Claro, você não vai querer saber pois, possivelmente, ele desfiará um rosário de cargos e diplomas. Se ele é cobrado e, por uma razão ou outra, não quer pagar, logicamente mandará o cobrador procurar seus direitos na justiça ou até na polícia.
            Mas se você ficar atento poderá perceber muito mais atitudes e assim detectar um arrogante, não podemos esquecer que, às vezes, alguém possa usar uma ou outra atitude arrogante sem o ser.
            Mas a maior demonstração de arrogância é quando o arrogante começa a definir o ser humano como uma invenção de Deus que não deu certo. É o momento glorioso em que ele se coloca acima dos seres humanos, um Deus, pois nunca diz que NÓS não demos certo, ele não se inclui entre os mortais, além do mais admite que Deus erra, pois inventou  um ser inútil, sem valor.
            No fundo mesmo, o arrogante é um fragilizado, que não consegue lidar  com as adversidades, se sente inferior por isso desqualifica a humanidade, só assim consegue sobreviver num mundo que lhe é hostil. A arrogância é tão somente um escudo.

                                   Xangô
é colaborador do Sopa de Cebola

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Mania de Limpeza
parceira do

Sopa de Cebola



Que preguiça II

A preguiça é a doença da ação

A preguiça tem alvo. Sua arma é o abandono. Quando temos preguiça tratamos nosso alvo como algo que simplesmente não nos interessa. Abandonamos ou ficamos abandonados a nós mesmos. Pode-se ter preguiça de conversar com amigos, mas também de educar os filhos, de ensinar alunos, de informar um funcionário sobre seus erros ou até acertos. A preguiça não vem do cansaço. É bom esclarecer que cansado é aquele que fez ou tentou fazer, que exauriu forças e não pode prosseguir por esgotamento. Esgotou uma força que havia. Preguiçoso é quem nem tentou fazer, mas está impedido por um outro motivo, o descaso. Em sua base está um desinteresse pelas coisas e pelas pessoas que, sem cuidado, pode se transformar em falta de respeito. O preguiçoso é aquele que esgota uma força que nunca existiu, ele se cansa antes de ter começado como se estivesse doente de uma curiosa incapacidade de agir.
Márcia Tiburi

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Tatá Cardoso
Fotógrafo é parceiro do

Sopa de Cebola

sábado, 25 de abril de 2015




Que preguiça I

A preguiça é um vício

Há preguiça demais e pouca análise dos seus motivos. Até por preguiça. Até parece a grande vitoriosa diante das possibilidades da vida. A preguiça é redundante. Seu nome próprio é a vitória sobre qualquer esforço, até o do pensamento que parece não exigir força alguma. Mas por qual motivo?
Os filósofos antigos se ocupavam da preguiça como um dos sintomas da melancolia que compõe a pré-história da depressão atual. A preguiça era falta de vontade de tudo e qualquer coisa. Na Idade Média, São Tomás de Aquino tratou-a entre os vícios capitais que se opunham às virtudes. Virtude, para o filósofo santo, era tudo aquilo que dizia respeito à realização da natureza de algo. Por exemplo: a virtude da faca é cortar, a virtude do homem é raciocinar, a virtude do cão de guarda é guardar assim como a da estante é suster livros. Neste sentido, mesmo sendo cristão, ele pensava como os antigos gregos. Vício, por outro lado, era tudo o que não alcançava seu próprio objetivo interno, era como perder-se no meio do caminho: uma faca que não corta, um homem que não raciocina, um cão que não guarda, etc. Mas por que algo deixaria de fazer o que deve, ou deixaria de realizar o motivo pelo qual existe?
A definição tomista de preguiça é importante ainda hoje: ela se caracterizava como uma tristeza que impossibilitava a quem dela padecia de agir para fazer o bem. A preguiça era um torpor do espírito que impedia o indivíduo de agir. Não era a maldade, mas a inatividade.
Não é nenhum exagero a sua íntima relação com a cultura brasileira. Quando Mario de Andrade escreveu seu Macunaíma não errou nem por um segundo quanto ao sentido da preguiça que, como sério fator cultural, nos assola desde sempre.


 Márcia Tiburi,  nascida em Vacaria, RS, dia 6 de abril de 1970 é artista plástica, professora de Filosofia e escritora.
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Ótica Buck
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Traço de implicância
À medida que  envelhece o ser humano torna-se mais implicante, com menos paciência. Comigo não é diferente, já beirando os 70. Não sou um implicante grosseiro muito menos deselegante. Não perco a compostura com filas, nem com a cara de mofo de algumas caixas de supermercados. Não esbravejo quando o supermercado fica com um ou dois centavos meus, da mesma forma que suporto esperar quem usa o caixa preferencial pagar as contas da família toda, não raro, da rua inteira. Mas, confesso, minha implicância se manifesta, porém se resume em comentários com amigos ou numa pequena catarse escrevendo, como faço agora.
Mas tem outra coisa que meu traço implicante se revela, embora não me afete diretamente, é o aparelho de televisão em restaurantes. Sento sempre  de costas para o tal e o que me impressiona é  a família sair para jantar ou comer uma pizza ficar comendo assistindo novela ou umas dessas bobagens televisas. Apenas transferem a sala para o restaurante.  
Além disso vivo me perguntando: qual a simbiose entre o  ônibus e o celular?  A pessoa adentra ao coletivo e já saca, da bolsa ou do bolso, o  aparelho. Pode ser um fetiche. Não sei. E porque alguém leva celular  quando vai ao cinema, ao teatro ou a um campo de futebol? Para fotografar, quem sabe, o problema é que alguns conversam durante a partida e não o desligam no teatro ou no cinema.
A lista de implicância é mais extensa, mas fico por aqui pensando em fazer terapia, me imaginando vivendo mais uns 10 ou 15 anos.
Jorge Nicoli
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Gráfica Color 7
fabricando sacolas e embalagens
Tel 3157-8910


sexta-feira, 24 de abril de 2015


Viver não é preciso

O sambista carioca Candeia (1935/1978) compôs, entre tantas coisas belas, Preciso me encontrar .Tem em seus versos: “vou por ai aprocurar. Rir para não chorar, se alguém por mim perguntar, diga que eu só vou voltar, quando me encontrar”. Ele procura a si próprio perdido em algum ponto da vida e, talvez, seja mais fácil encontrar a agulha no palheiro do que se encontrar.
O filósofo prussiano Nietzsche (1844/1900), num outro contexto,  fala algo como “é preciso ser perder, vez ou outra, para poder se encontrar” e podemos encarnar Fernando Pessoa (1882/1930), com seu  “viver não é preciso”. É isso, não há nada preciso na vida, os caminhos são tortuosos, repletos de obstáculos, onde não há atalhos.  Por tudo isso que  nós nos perdemos, na maioria das vezes, involuntariamente, como na música de Candeia, outras, voluntariamente, sugerido pelo filósofo. E como se encontrar? Se não sabemos onde nos perdemos e em qual momento isto aconteceu.
O perder-se de si mesmo é entrar num rodamoinho de situações, aparentemente insolúveis, é girar em torno de seu próprio eu, é dar voltas numa pequena praça com várias ruas e entrar sempre na que não tem saída, É o caminhar com os olhos vendados por uma escura floresta. Candeia diz que quer ver “o sol nascer, as águas do rio correr, ouvir os pássaros cantar”.  Talvez seja  uma forma de se encontrar, o encontro com as coisas da natureza. O tempo para refletir sobre a própria vida. “Quero nascer, quero viver, clama o compositor, que poderíamos substituir por quero re-nascer, quero re-viver.
Mas há o se perder sugerido por Nietzsche que é o de deixar a estrada que leva ao nada para embrenhar nos  trechos improváveis, é deixar de lado a alma engessada por conceitos para se apossar da liberdade do se permitir os enganos. È o se encontrar consigo mesmo e ter a percepção da imprecisão da própria vida. Como diz Fernando Pessoa.
Bem, como sempre digo,  não sou psicólogo e nem tenho pretensões em escrever livro de auto-ajuda. Pode ser que não tenha a devida competência para ambas, portanto apenas faço reflexões e, não raro, vago por  caminhos desconhecidos.

Emílio Migliori
É colaborador do Sopa de Cebola


Mandala
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Cinema em Casa

Relatos Selvagens (Relatos Salvages, Argentina/Espanha, 2014, direção de Damián Szifron,  com Oscar Martinez, Erica Ribas, Mônica Nilla, Ricardo Darin. Todos sabem da grande rivalidade entre o futebol brasileiro e o argentino: qual a melhor seleção? Os melhores jogadores? Agora, se o assunto for cinema e os filmes, a Argentina dá de goleada, sem dúvida nenhuma. O cinema argentino tem feito bonito e alguns filmes já foram laureados em importantes festivais internacionais e já levou para casa o prêmio que o Brasil  persegue há anos, o Oscar  e foram dois: “A História Oficial,1985 e O Segredo de seus Olhos, 2009.
Vale tal preâmbulo para falar de uma produção recente que fez grande sucesso de bilheteria e crítica, em vários países e claro, concorreu ao Oscar de melhor filme estrangeiro 2015; trata-se de Relatos Selvagens. Uma clara demonstração do nível da atual produção portenha.  Um cinema vigoroso, crítico, robusto e com muitas coisas interessantes para mostrar e contar. E, muito particularmente, causa certa inveja, ao muitas vezes “moribundo e deficitário” cinema made in Brasil.
Relatos Selvagens é uma comédia com muitas pitadas de drama, suspense e muito humor negro explícito ou nas entrelinhas (ou entre fotogramas?), são seis histórias,  onde, nem sempre, todas s seguem o mesmo ritmo, apesar de ter o mesmo diretor. O roteirista/diretor Damián Szifron traz seis acontecimentos do cotidiano de pessoas comuns; a rotina do trabalho, uma viagem aérea, um acidente de carros;  uma festa de casamento. Histórias que podem ou poderiam acontecer com qualquer ser vivo. O universal se particularizara em cada história: vingança, agradecimento, esperança, sonho, amor, ódio, raiva, perplexidade diante de fatos, aparentemente, sem soluções fáceis. Um retrato sem retoques ou sem fotoshop aparece em cada um dos relatos, selvagens ou mesmo bárbaros no sentido da crueldade, que pode  brotar inesperadamente como resposta a um determinado estímulo. Algumas situações são hilárias, mas tornam-se trágicas, com o passar do tempo. Um clima nonsense percorre o filme. A complexidade e os porquês das atitudes humanas desfilam pela tela. O “lado b” do ser humano está todo lá. Não seria errado afirmar que aparece um quase raio-X da alma humana!
O elenco que conta as histórias é fantástico, o nome mais promissor do atual momento do cinema argentino se faz presente: Ricardo Darin.
Para se ver junto e surgirão boas discussões e reflexões, assuntos pertinentes que despertam a vontade de questionamentos. Veja mesmo. Vale lembrar que é uma co-produção argentina/espanhola e tem o, não menos genial, cineasta Pedro Almodóvar envolvido na produção.

Joel B. Ramos
Colaborador do Sopa de Cebola
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Vitória Parra
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quinta-feira, 23 de abril de 2015





Um lugar de gente bonita
            Shopping, uma invenção americana. Um lugar de gente bonita e bem vestida, aliás tudo ali é muito limpo e asséptico, Nenhuma bita de cigarro no chão, nenhum papel,nem uma sujeirinha que seja. As pessoas que se acotovelam pelos corredores, quase sempre dependuradas em seus celulares, cada vez mais sofisticados e inúteis, estão bem arrumadas, com pose burguesa, mesmo que morem na periferia,, vítimas de um capitalismo cruel e desumano. Não importa, o que conta é estar passeando pelos limpos corredores do shopping, ali se sentem ricas, longe de um mundo desigual, afinal o que não se vê por l[a são mendigos nem cachorros.
            Olham as vitrines, mesmo que os preços não sejam compatíveis com seus salários, mas se empanturram com sanduíches e cocas, comem comida insossa, mas o importante é estar lá. É comprar bobagens sem nenhuma utilidade. É sentir fazendo parte de um mundo irreal, um mundo de sonhos. Ver um mundo sem mácula, sem perigo, onde todos são capitalistas. Entrar num shopping é como fazer parte de um conto de fadas, ser um príncipe ou uma princesa.
            Mas este sonho acaba, hora de fechar o shopping, é hora de sair e entrar na realidade dos mendigos, dos perigos, de gente feia, de seres humanos. Uma realidade cruel que vai que ter de ser enfrentada até o próximo fim de semana.
  Xangô
é colaborador do Sopa de Cebola

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TB Engenharia
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Cumprimento ignorado
Não sou psicólogo, como não sou sociólogo, muito menos sábio, somente escrevo por necessidade vital. Para  isto costumo observar pessoas e acontecimentos.  E faço como exercício.
E neste exercício de observar  me chama a atenção o comportamento de algumas pessoas quando as cumprimento com um bom dia ou boa tarde, às vezes, boa noite, e o faço porque gosto. Nada mecânico,  sempre acompanha um sorriso. A maioria responde ao cumprimento e sinto – pode ser apenas impressão -  que  alguns se mostram surpresos. Outros nem respondem. Claro que existe uma boa parcela que retribui até com um sorriso mais exuberante que o meu.
Mas queria falar dos que tem  certa dificuldade em responder a um cumprimento normal e parte da educação social. Não os conheço para emitir qualquer conceito, porém não posso negar o incômodo causado, porque é algo simples, não há nenhum esforço maior para responder a um cumprimento, e se negam. Não acredito em deselegância ou má educação. Pode ser desatenção  ou preocupação com alguma coisa. Ou devaneios. A outra hipótese a de não ir com minha cara, não me achar simpático o suficiente para ser agraciado com um cumprimento. Pode ser.
Para ir mais longe. penso que há nos dias de hoje uma ideologia envolvendo  as pessoas. Ideologia que difunde o conceito da pressa, das responsabilidades com todas as coisas, mesmo as de pouca importância, conceito de pós- modernidade  - uma bobagem semântica -  e principalmente, o conceito da falta de diálogo. Não sou ingênuo para achar que não existe um grande déficit no quesito dialogar. Internet, televisão, celular modernosos substituem o contato, só que me parece que as pessoas aceitam passivamente esta ideologia, não a contestam e por isso não respondem meu sorridente cumprimento.
Jorge Nicoli

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Barraca das Dondocas
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quarta-feira, 22 de abril de 2015




Descoberta do Outro Mundo

Por milhões de anos, os primeiros homens acreditaram que a morte era o único fim do indivíduo e que a dor, a tristeza e a melancolia eram inevitáveis e incuráveis. Estavam de tal maneira habituados a ver constantemente a morte e a dor, que as consideravam um fato corriqueiro e irremediável. E, assim, abandonavam os corpos e não os sepultavam, da mesma forma como fazem os animais ainda hoje.
Depois, em um certo momento, os seres humanos "descobrem” o outro mundo: podemos inclusive datar essa “descoberta”, porque coincide com a construção da primeira sepultura. A mais antiga, de noventa mil anos atrás, foi encontrada em Belém, na Judéia, que é também o lugar de um famoso berço. Desde então, o homem é o único ser vivo que enterra seus mortos, talvez por medo do contágio, do mau cheiro e do nojo causados pela putrefação.
Mas isto não explica porque deixavam, ao lado dos corpos, também utensílios e objetos preciosos que deviam ajudar o defunto na outra vida. Fica evidente aqui a esperança de que o corpo ressuscite e de que exista uma vida ultraterrena num outro mundo que fica além deste.
Em resumo, há noventa mil anos criou-se esta primeira e grande consolação, que suaviza a idéia do fim definitivo.

Domenico De Masi é um sociólogo  italiano contemporâneo, famoso pelo seu conceito de "ócio criativo" segundo o qual o ócio, longe de ser negativo, é um fator que estimula a criatividade  pessoal. Nasceu em 1º de fevereiro de 1938.


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Letras & Cia.
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