Que preguiça I
A preguiça é um vício
Há preguiça demais e pouca análise
dos seus motivos. Até por preguiça. Até parece a grande vitoriosa diante das
possibilidades da vida. A preguiça é redundante. Seu nome próprio é a vitória
sobre qualquer esforço, até o do pensamento que parece não exigir força alguma.
Mas por qual motivo?
Os filósofos antigos se ocupavam da
preguiça como um dos sintomas da melancolia que compõe a pré-história da
depressão atual. A preguiça era falta de vontade de tudo e qualquer coisa. Na
Idade Média, São Tomás de Aquino tratou-a entre os vícios capitais que se
opunham às virtudes. Virtude, para o filósofo santo, era tudo aquilo que dizia
respeito à realização da natureza de algo. Por exemplo: a virtude da faca é
cortar, a virtude do homem é raciocinar, a virtude do cão de guarda é guardar
assim como a da estante é suster livros. Neste sentido, mesmo sendo cristão,
ele pensava como os antigos gregos. Vício, por outro lado, era tudo o que não
alcançava seu próprio objetivo interno, era como perder-se no meio do caminho:
uma faca que não corta, um homem que não raciocina, um cão que não guarda, etc.
Mas por que algo deixaria de fazer o que deve, ou deixaria de realizar o motivo
pelo qual existe?
A definição tomista de preguiça é
importante ainda hoje: ela se caracterizava como uma tristeza que
impossibilitava a quem dela padecia de agir para fazer o bem. A preguiça era um
torpor do espírito que impedia o indivíduo de agir. Não era a maldade, mas a
inatividade.
Não é nenhum exagero a sua íntima
relação com a cultura brasileira. Quando Mario de Andrade escreveu seu
Macunaíma não errou nem por um segundo quanto ao sentido da preguiça que, como
sério fator cultural, nos assola desde sempre.
Márcia Tiburi, nascida em Vacaria, RS, dia 6 de abril de 1970 é artista plástica, professora de Filosofia e escritora.
__________________________________
Ótica Buck
parceira do
Sopa de Cebola
Nenhum comentário:
Postar um comentário